quarta-feira, 28 de maio de 2014

Relato - Experiência com Agricultura Familiar

Pedro Grabois

Dia 2 de abril de 2014, Mendes, pequena cidade do interior do estado do Rio de Janeiro. Cerca de 30 pessoas reunidas debaixo do sol num pequeno sítio de alto de morro, entre produtores rurais, técnicos do SEBRAE, instrutores do Programa de Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (PAIS) e funcionários da prefeitura de Mendes. O objetivo do encontro: oferecer uma capacitação e promover um mutirão para implementar um sistema interessantíssimo de produção agrícola sem o uso de agrotóxicos. O sistema inclui: materiais para a irrigação por gotejamento (a partir de uma caixa d’água de 5 mil litros), um galinheiro (com 9 galinhas e 1 galo), uma série de  mandalas de plantação situadas em torno do galinheiro, grãos, dentre outros materiais. Este kit é fornecido a cada produtor contemplado pelo PAIS, além do suporte dos técnicos especializados.

Dentre os pequenos produtores rurais presentes, a maioria já utilizava a terra como complemento da renda e/ou como complemento do fornecimento de alimentos para própria família. Todos tinham uma mesma expectativa: tornar a riqueza da terra algo constante, organizado, planejado, de modo a poder viver da mesma (alimentando-se diretamente e usufruindo da renda obtida pela venda dos produtos plantados). Expectativa partilhada pelos funcionários da Prefeitura, uma vez que a produção agrícola estando organizada gera riqueza não só para quem trabalha na terra, mas para toda a cidade. Esta também era (e é) a expectativa dos meus tios Marilisse e Danilo, que cuidam do Sítio do Vôlisse, situado no distrito de Engenheiro Morsing (Mendes-RJ).

Antes de pegarmos no trabalho pesado (cavar; fixar vigas de madeira para o galinheiro; levantar uma pequena plataforma para colocar a caixa d’água, dentre outras atividades), conversamos um pouco sobre a riqueza que tínhamos nas mãos ali enquanto pequenos produtores rurais. A agricultura familiar é responsável por fornecer 70% dos alimentos da mesa dos brasileiros; existe uma lei (n. 11.947/2009) que obriga que no mínimo 30% da alimentação escolar seja oriunda da “agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas”; os consumidores cada vez mais exigentes dão grande valor à alimentação produzida sem o uso de agrotóxicos.

Aqui, cabe uma conclusão desse brevíssimo relato. A riqueza que a agricultura familiar tem nas mãos é enorme e não passa pelas estratégias do agronegócio. No agronegócio, quanto mais recursos tecnológicos e químicos se utiliza, mais retorno se obtém da terra plantada. Para explorar assim a terra, é preciso grande soma financeira, coisa que os pequenos agricultores não têm. Nessa briga então, se o(a) pequeno(a) quiser utilizar as mesmas estratégias do agronegócio, sairá perdendo. O(a) pequeno(a) agricultor(a) tem uma riqueza “natural” nas mãos. No entanto, seu desafio está em planejar a produção e ser incluído na rede de fornecimento da alimentação escolar. Produzindo regularmente e sem o uso do veneno, as famílias rurais têm a possibilidade de obter um retorno fixo não só para si, mas toda a cidade na qual estão inseridas. Com certeza, os desafios são bem mais amplos que isso, mas espero que juntos, cidade e campo, possamos produzir riquezas para as famílias, as escolas, enfim, para nós mesmos, sem passar por uma indústria que usa sistematicamente produtos tóxicos na produção de alimentos. 

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Pedro Grabois é articulador da Rede FALE e doutorando em Filosofia pela UERJ

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