segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

NATAL, NATALIDADE E MEMÓRIA

por * Ronilso Pacheco

"Em Ramá se ouviu uma voz, lamentação, choro e grande pranto; era Raquel chorando os seus filhos e não querendo ser consolada, porque já não existiam".
Mateus 2: 18


A alegria da comemoração do nascimento do Filho de Deus entre os homens não deveria ser desprovida também da memória do seu contexto. O menino Jesus foi, sobretudo, um sobrevivente. Sobreviveu a uma perseguição pessoal do governante que, dono da legitimidade do uso da violência, põe o estado a serviço da execução de todas as crianças que tivessem entre 0 e 2 anos; foi refugiado em terra estranha com seus pais; o menino Jesus já nasce marcado para morrer.

Nessa história Jesus se identifica com tantas crianças cuja natalidade beira o risco. O risco da falta de segurança, cuidado e proteção; o risco de estar desprovido dos direitos a que tem direito e das oportunidades que lhes pavimentam caminhos; o risco da morte violenta, seja pela agressão doméstica, seja pela vulnerabilidade nos territórios onde a paz não é garantida; o risco do abandono, sobretudo do estado que lhe vira as costas; risco do estado, e de uma parcela considerável da sociedade, que a enxerga como um inimigo em potencial (dependendo da música que ele queira ouvir, da cor de sua pele e de onde ele poderá morar).

Jesus não simplesmente nasce, seu nascimento também evidencia uma negligência, uma desumanidade, um mundo classista, violento e arriscado. Pensemos nisso também.



*Ronilso é de São Gonçalo (RJ), trabalha no Viva Rio e é membro do FALE-RJ