O relato de Luciana Fernandes,articuladora da Cuiabá do Projeto Copa 2014, sobre o 16º Mutirão de Oração Por Crianças e Adolescentes em Situação de Risco .
“Nestes últimos dias 3, 4 e 5 de junho aconteceu o mutirão de oração a favor das crianças em risco. Dias preciosos! Muita gente se lembrando das crianças e orando por elas. Oração é sempre bom. Muitas orações, melhor ainda!
Dentre as programações e mobilizações de pessoas, da igreja para fazer parte do mutirão aqui em Cuiabá (MT), estava um bate-papo com as crianças de uma igreja. Uma breve explicação sobre o mutirão, sobre a importância de orarmos e logo fomos para a prática: oração! Assim como foi sugestão no próprio material de apoio da Rede Mãos Dadas, utilizei o Guia de Oração com os pedidos e nos dividimos em grupos. Quatro grupos. Eu fiquei responsável por um deles.
Grande surpresa estava por vir! Eu sabia que em meio a esta campanha contra exploração sexual de crianças a adolescentes poderia encontrar essa realidade, mas assim, tão rápido? Tão perto? Sozinha? Não imaginava! Aquela criança… que participava do bate-papo, que respondia as perguntas de por que orar. Que acrescentava informações: “é importante orar pelas crianças que são abusadas, que são vendidas”, dizia ela, uma das mais falantes do grupo que tinha um comportamento desconfiável. Porém, não desconfiei desde o início. Ela participava das conversas e desejava orar. A oração que ela fez foi a única que tocou nesta palavra: “sexual” (exploração sexual). Assim como ela, outras crianças também oraram, mas ela ainda continuava falando, até que disse que havia acontecido algo com ela. Eu estranhei e perguntei o que seria isso. Ela apenas respondeu que era algo muito sério e que não poderia falar em público. Eu estranhei mais ainda! O que será?
No começo não dei muita atenção, mas ela estava séria. Eu sabia que não podia desprezar o que as crianças falam e que devem ser levadas a sério. Até que ela chegou próximo ao meu ouvido e desabafou: “Tia, eu fui explorada!” A minha reação foi de muita surpresa! Não esperava me deparar com essa realidade naquele momento. Eu queria acreditar: “como essa criança brinca com uma coisa séria dessas?” Eu continuava surpresa e não sabia o que fazer! O que eu faço? Como assim? Aqui na igreja? Tão rápido? Eu estou sozinha! Não há nenhum adulto com experiência pra me ajudar e falar com essa criança?! Antes dessa revelação inesperada e forte, havia deixado claro à menina que se ela quisesse conversar eu estava pronta para ouvi-la. Na verdade, não estava pronta. Tomei uma atitude sem pensar direito (o momento pedia uma resposta rápida). Bem… reafirmei: “se você quiser, pode vim falar comigo sobre isso no final.”
Não! O que eu estava fazendo? Não podia deixar isso passar. Então a chamei para conversar ali mesmo, mesmo não sabendo o que falar direito. Agora estávamos sozinhas no templo do culto infantil. Ela me contou tudo! Contou que foi abusada por um homem que trabalha no prédio dela. Ela estava nervosa. Chorava ao contar. Foi horrível! Ela tão pequena… passou por isso. É revoltante! É horrível!
O culto terminou e, na ausência da filha, a mãe da menina veio buscá-la e viu nós duas conversando. Eu deveria dar uma explicação para a mãe. Ela sentou-se pronta a me ouvir e contei o que havia acontecido. Aproveitei para saber um pouco mais, sobre o que aconteceu. Revoltante! Aquela menina não foi a única vítima! Eu… eu… orei com as duas… era o que eu podia fazer naquele momento. Só clamar a Deus por misericórdia daquela criança, daquela família!
Quando voltei para casa (como sempre, voltando de ônibus do culto) observei melhor o caminho que fazia. Ainda estava assustava e chocada com a declaração da menina. Eu já havia notado aquele trecho: um trecho triste, onde pessoas se drogam, se prostituem. Tudo bem nítido! Sim, já orei por elas, já pensei nelas, porém dessa vez eu as vi de forma diferente. Olhei-as como crianças que não tiveram uma família, uma oportunidade na vida, educação, sem ninguém para acolhê-las.
Agora eles estavam nas ruas. E se desde o começo elas tivessem alguém que falasse de Cristo pra elas? E se alguém tivesse se importado com o que aconteceu com elas no início de tudo? Talvez elas não estivessem naquela situação! Elas não tiveram educação, família, infância, saúde, dignidade. Foram esquecidas.
Essa criança lá da igreja tem ainda uma família (graças a Deus!), está dentro de uma igreja, mas e aquelas que não têm lugar para ir? Que são abusadas dentro de casa? Fogem? São levadas ao tráfico?! Estão aí! Tem muitas e só olhar nas ruas à noite.
E se alguém tivesse falado de Cristo para o abusador? E se esse cara tivesse alguém que lhe ensinasse sobre Deus? Será que ele poderia conhecer um bom caminho? Será que ele poderia não escolher essa vida de maldade? Cadê? Onde estão aqueles para acolhê-lhos? Cadê? A igreja? O que a gente pode fazer agora? A verdade é que não sabemos o que fazer! A igreja não sabe o que fazer! Estamos despreparados e a igreja não toca neste assunto. Não sabemos que em nós, essas crianças e as pessoas podem encontrar ajuda e refúgio?
Não quero que Deus me ache hipócrita, como quem não se importa, como alguém que não faz. Se não amamos ao próximo, não amamos a Deus! Isso é fato! Nós somos jovens! Nós temos que marcar a nossa geração. Eu quero marcar a minha geração. Eu quero ver jovens trabalhando. Eu quero ver jovens chorando! Quero ver adoradores! De verdade, não dá pra viver assim. Precisamos fazer alguma coisa! Precisamos orar. Deus tem misericórdia de nós! Misericórdia!A minha oração é que Deus desperte. Desperte os filhos dele. Dê óculos espirituais! Porque não temos noção. Agora é a hora! Deus tem misericórdia e concerta as coisas a começar em nós. Eu vou escrever isso! Eu vou falar! Temos que fazer a nossa parte “para ontem”.
Nesses últimos dias tenho me lembrado muito destas palavras de Jesus: “Pai perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem.” O que é isso? Que negócio é esse? Que amor é esse, Jesus? É por mim, é por você, é pela criança, é por aquele… homem!!!
“Graça”: essa palavra tem significado muito forte e eu não a entendo! O peso que tem isso, e vou ficar um tempo sem entender, e depois eu vou vacilar de novo, cair, levantar, acordar pra mais, abrir os olhos pra outras realidades. Na verdade, não iremos entender tudo de ruim que há no mundo, não iremos suportar! Cristo levou tudo isso e suportou na cruz! Oh Deus! Dá vontade de sentar e chorar! Mas uma coisa é certa: não dá pra ficar assim. Temos que agir e vamos começar dobrando os nossos joelhos porque também não sei como agir, a igreja não sabe como agir, mas Deus vai mostrar! Deus está agindo já”!
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Caso você queira saber mais sobre o “Projeto Copa 2014"- Campanha de enfrentamento à exploração sexual de crianças e adolescentes no turismo”, clique aqui!
Texto retirado do site da Rede Mãos Dadas - www.maosdadas.org/mmo
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