terça-feira, 30 de outubro de 2012

“Quando uma luta vira política pública”


Juventude Viva – Plano de enfrentamento à violência contra a juventude negra

Por Ana Elizabete Machado*

As palavras do título foram postadas por Morgana Boostel em uma de suas redes sociais com bastante entusiasmo, e com razão. No último dia 27 de setembro em Maceió foi feito o pré-lançamento do Plano de enfrentamento à violência contra a juventude negra.
Resultado da luta do movimento negro e vários movimentos sociais em apoio, o Plano, foi apresentado ao Conjuve (Conselho Nacional de Juventude), de forma consultiva, no ano de 2011 e recebeu apoio da Rede Fale e ABUB pelos então conselheiros Max Dias e Pedro Grabois, respectivamente.
O Plano trata de políticas públicas que atuam enfrentando a violência contra a juventude negra brasileira, pois, de acordo com os dados a seguir, esta é a parcela da população que mais sofre com a violência em nosso país.
Em 2010, em todo o Brasil, morreram 52.260 pessoas vítimas de homicídio, destas 66, 9% eram negras. Deste total de mortos por homicídios 53,5% eram jovens entre 15 e 29 anos, destes jovens assassinados 70,9% eram negros. E num total de 91,3% das vítimas de homicídio no Brasil em 2010 eram do sexo masculino. E aproximadamente 70% dos homicídios contra jovens negros concentraram-se em apenas 132 municípios brasileiros. Entre os anos de 2000 e 2009 a diferença entre o número de homicídios contra jovens brancos e jovens negros saltou de 4.807 para 12.190, em 2000 foram assassinados 9.248 jovens brancos, enquanto negros foram 14.055 e em 2009 foram 7.065 brancos e 19.255 jovens negros assassinados. Estes dados vêm do Ministério da Saúde através do SIM (Sistema de Informação sobre Mortalidade), dados preliminares de 2010 e do Datasus também do Ministério da Saúde. Ainda da mesma fonte de dados descobriu-se que os jovens negros com baixa escolaridade são os mais atingidos pela violência.
A partir deste quadro injusto percebeu-se a necessidade do enfrentamento público desta realidade. E depois de um processo de discussão e elaboração no Fórum de Direitos e Cidadania (julho-outubro de 2011), consulta ao CONJUVE, ao CNPIR, a participação nas duas reuniões Interconselhos (dezembro 2011 e fevereiro 2012), reunião com o Movimento Hip Hop (janeiro 2012), reuniões ministeriais para discussão e incorporação das propostas (janeiro-fevereiro 2012) e reunião com especialistas em Segurança Pública (abril 2012) lançou-se o seguinte Plano: Juventude Viva – Plano nacional de enfrentamento à juventude negra.
O Juventude Viva é uma parceria entre a Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) que atuará de forma interministerial utilizando meios do Ministério da Cultura (MinC), Ministério da Saúde (MS), Ministério da Educação (MEC) como os CAPS, CRAS, Postos de saúde, Usinas culturais, Estação Juventude, Escola Aberta, Mais educação, entre outros, e ainda há parcerias com outros ministérios. A execução do Plano deverá contar com o apoio dos estados e municípios constados dentro dos territórios demarcados com maiores índices de violência contra a juventude negra.
Dos 132 municípios demarcados como os mais violentos contra a juventude negra estão todas as capitais, logo a execução do Plano deverá ocorrer em todos os estados, com a elaboração de planos locais e estaduais, a implementação de ações para a melhoria da atuação policial e do Sistema Penitenciário, inclusão de ações de prevenção à violência nas redes públicas de ensino e saúde, definição dos territórios locais sobre os quais se darão as atuações dos programas e divulgação dos mesmos para os jovens com perfil compatível.
O Plano prevê o aperfeiçoamento da atuação institucional no enfrentamento à violência contra a juventude negra partindo da sensibilização de agentes para o enfrentamento ao racismo e estigmas contra a juventude, fortalecimento dos mecanismos de controle externo e interno das polícias, redução da letalidade policial através da renovação da Matriz Curricular das Polícias, lançamento de novos Procedimentos Operacionais Padrão –POP Abordagem Policial, passando pela formação de agentes de segurança e agentes penitenciários, criação e efetivação do Disque Igualdade Racial, e outros.
A transformação dos territórios com maiores índices de violência se dará por meio da ampliação da oferta de equipamentos, serviços públicos e espaços de convivência, fortalecimento da atuação da escola como espaço implementador de novas práticas que contribuem para a superação da cultura da violência, e promoção de atividades de cultura, esporte e lazer, através dos meios dos ministérios já citados acima.
A partir da inclusão, emancipação e da garantia de direitos acredita-se que os jovens em situação de vulnerabilidade poderão desenvolver novas perspectivas para suas vidas e para o país, por isto, o Plano envolve a apresentação de novas perspectivas na formação educacional, profissional e para a cidadania, a ampliação da oferta de programas e ações específicas para jovens de 15 a 29 anos nesta situação para fomentar trajetórias de inclusão e autonomia, a criação de oportunidades de atuação dos jovens em ações de transformação da cultura de violência e reconhecimentos da importância social da juventude através de programas como PROTEJO, Projovem Urbano, PRONATEC, Prêmio Hip Hop, Prouni, Vivajovem.com, e outros.
Faz-se necessária a desconstrução da cultura de violência vigente nestes territórios, logo espera-se com o Plano promover a discussão crítica sobre a banalização da violência como resultado da crise de valores que passa toda a sociedade,  evidenciar que a juventude negra é o principal alvo deste processo,  mobilizar atores sociais para a promoção de direitos das juventudes negras a partir das ações previstas no Plano, articular territorialmente as ações de prevenção à violência no município por meio da Rede Juventude Viva, o Participatório (observatório participativo da juventude, que deverá ser lançado até o fim do ano), campanha contra a banalização da violência e núcleos de prevenção à violência e promoção da saúde e cultura de paz.
Como observamos o Plano Juventude Viva atuará em várias frentes e nós como Rede Fale podemos individual e coletivamente colaborar com este processo em diferentes  pontos. Entendendo que enquanto cristãos neste mundo devemos, sem perder a esperança (pois a nossa não pode morrer novamente), caminhar lutando pela Justiça, e é em nome da Justiça que levantamos nossa voz junto as estes que promovem o Plano: queremos a Juventude Negra viva!


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* Ana Elizabete Machado é Conselheira Nacional de Juventude (Conjuve) pela Rede Fale, desde abril deste ano.

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