É chegado mais um
momento de corrida eleitoral na democracia brasileira. Tradicionalmente, as
eleições são, para muitas pessoas, os únicos momentos em que se propõem a
debater os processos de exercício da política. Lamentamos que a reflexão sobre
nossa realidade política não seja parte do dia a dia, no acompanhamento de
parlamentares, na discussão das grandes questões nacionais, na participação
social e no monitoramento de políticas públicas, o que nos permitiria dar um
salto qualitativo na construção de nossa democracia e num projeto de nação mais
justo e equânime, com ética na política e boa governança nas políticas
públicas.
Como observado desde a
redemocratização e de forma crescente nos últimos anos, o voto evangélico é um
dos componentes de grande destaque do processo eleitoral. Fruto da maciça
expansão evangélica, sobretudo pentecostal, bem como de seus efeitos mesmo nos
segmentos do chamado protestantismo histórico, a participação cada vez mais
ativa de atores evangélicos dos mais variados matizes e concepções políticas e
teológicas na política brasileira impõe um desafio de análise a todos que se
detém a compreender a conjuntura eleitoral. Se por um lado, o tradicional
desinteresse evangélico pela política já foi superado e cada vez mais os crentes
deixam de voltar seus olhares apenas para o porvir; por outro, o investimento
evangélico na política comporta uma série de práticas distintas e heterodoxas
que não estão em consonância nem com a melhor tradição cristã de participação
política (por ex., William Wilberforce, Abraham Kuyper, Martin Luther King Jr.,
José Míguez Bonino, Guaracy Silveira, Paulo Wright), nem com valores
republicanos e democráticos.
No Brasil, há dois
perigos diante do cristão que compreende que precisa atuar politicamente: o
primeiro é achar que simplesmente por “ser crente” está abençoado para a
política. Essa é a concepção que leva milhões de brasileiros a votar no “pastor”
ou no “irmão abençoado pelo pastor”. Como consequência, muitos parlamentares
são eleitos sem compromisso com a justiça ou a democracia, e sem coerência partidária,
programática ou ideológica, e se tornam “despachantes de igrejas” – gente que
vota sempre para a expansão do poder de suas igrejas, associações, rádios e
empresas. Por fim acaba-se acreditando que a única – e mais rápida – solução para
o Brasil é eleger um governante ou parlamentar “crente”, e declarar de boca que
“o Brasil é do Senhor Jesus Cristo”. O segundo problema tem maior profundidade:
é quando os cristãos acham que podem transformar a declaração fundamental do “eu
creio” da sua fé em lei para ser imposta pelo Estado. Isso ocorre quando
queremos reduzir o que consideramos a Revelação de Deus a uma mera proposição
de solução para nossos problemas cotidianos, acreditando que existe uma “política
cristã” ou uma “economia cristã”; ou seja, que sistemas políticos e econômicos podem
expressar “fé”. Eles podem ser interessantes, justos, úteis e efetivos, mas não
podem expressar fé no sentido da Revelação!
Nós da Rede FALE, cidadãs e cidadãos cristãos
que compreendem e identificam sua missão na defesa dos direitos humanos e da
justiça, denunciamos dois anos atrás, durante o último período eleitoral, o
“voto de cajado”, assim conceituado a partir de uma metáfora que carrega em si
o emblema da modernização conservadora que tanto nos assola: trata-se da
releitura das velhas práticas de exercício do poder, incidindo de forma
autoritária sobre o comportamento eleitoral da população (consagrado na
literatura política como “voto de cabresto”), agora replicadas por pastores
evangélicos junto a seus rebanhos nos arraiais evangélicos de todo o país.
Evidentemente, nossa denúncia tem por alvo certas formas específicas de
interseção entre as campanhas eleitorais e o eleitorado evangélico. Queremos
afirmar novamente, de forma clara e inequívoca, nossa perspectiva sobre o que
consideramos como “voto de cajado” e uma aberta condenação desta prática como
traição à melhor tradição cristã de participação política.
Declaramos que a fé não
pode ser tratada como moeda para se conseguir vantagens materiais ou simbólicas
e é lamentável que a sede de poder, que tem contornos diabólicos, seja ainda
hoje uma tentação para muitas lideranças cristãs. Os pactos espúrios com
partidos ou candidatos para conseguir benefícios para igrejas ou denominações,
como, por exemplo, a doação de terrenos para templos, obter concessões de
rádios e TVs ou mesmo obter tratamento diferenciado perante a lei, são apenas
alguns tipos de barganha, “acertos”, acordos e composições de interesse que
infelizmente costumam acontecer “por trás dos púlpitos”, durante as campanhas
eleitorais, envolvendo políticos e candidatos evangélicos. O papel da Igreja na
sociedade, como bem disse o pastor batista Martin Luther King Jr., não é servir
ao estado ou ser seu senhor, mas zelar para ser sua consciência crítica. Por isso,
entendemos que a Igreja, antes de desejar as salas de poder, deve estar pronta
para o Serviço, para a busca da justiça e para a propagação do Amor, valores
capazes de transformar as estruturas da sociedade.
Somos a favor de que
haja nas igrejas um processo comunitário de reflexão, oração e investigação de
temas e os lideres devem se empenhar para que seus membros votem com ética e
discernimento. Porém, a bem de sua credibilidade, eles devem evitar transformar
o processo de elucidação política num projeto de manipulação e indução político-partidário.
Ademais, no debate político-partidário, a opinião dos líderes deve ser ouvida
apenas como a palavra de um cidadão/ã, e não como uma profecia, e a ética
pastoral indica que ele/a não deve favorecer sua inclinação pessoal em
detrimento da dos outros irmãos/ãs.
Denunciamos, portanto,
como “voto de cajado”, as seguintes práticas e outras similares a estas:
- O uso do poder pastoral
para guiar a consciência dos fiéis, como um curral eleitoral, em benefício de
qualquer candidato.
- A utilização das Sagradas
Escrituras ou de imagens bíblicas de forma capciosa, a fim de legitimar a
candidatura de uns e demonizar a candidatura de outros.
- A venda de consciência e dos votos dos membros
da igreja a algum candidato, em troca de recompensas materiais concedidas “a
liderança, congregação ou denominação.
- A permissão do uso do púlpito
como plataforma de propaganda partidária e eleitoreira, ou de apresentação de
quaisquer candidatos para fins eleitorais.
- A coação ou ameaça aos
subordinados ou membros da igreja para que manifestem inclinações políticas iguais
às de seus líderes para eleger candidatos de fora ou de dentro da igreja.
- A transferência da imagem
de pastores ou líderes religiosos para candidatos em propaganda eleitoral,
afirmando-os como candidatos escolhidos por Deus ou demonizando seus
concorrentes.
- Lideranças evangélicas
que demonizam opções políticas diferentes das suas, caluniando-as, em vez de
ajudarem a fazer o debate sobre as propostas dos candidatos.
Convocamos os/as
irmãos/ãs a terem cuidado com lideranças que defendem que as igrejas tenham “candidatos
oficiais” para defender isso ou aquilo em nome da fé. Avalie propostas e
programas de governo, investigue a trajetória dos candidatos, compreenda quais
as principais funções e papéis que serão desempenhados pelos candidatos, vote
com sua consciência!
Nesse momento especial de nossa nação, cumpramos
com integridade e espírito Público nossa vocação de cidadãos e cidadãs
brasileiros. Para os nossos irmãos e irmãs de fé, nosso estimulo é: “pratique a
justiça, ame a misericórdia e ande humildemente com o seu Deus” (Miqueias 6.8).
5 comentários:
Os srs só podem ser infiltrados em nosso meio! Quem sabe não pertençam a OpusDei! Tendo como objetivo enfraquecer a participação dos nossos representantes na política. Poderiam sim os srs estarem lutando contra as propostas que visam
Enfraquecer os laços de família. A violência contra mulher, a exploração do trabalhador, a ineficiência do estado contra o tráfico de drogas e pessoas. A corrupção endêmica em nosso país. A redução da menor idade penal, a revisão do Código Penal. Etc. Tanta coisa mais importante! Os srs estão a serviço daquele que obscurece o entendimento, daquele que e o inimigo de nossas almas. No momento em que nós estamos frontalmente sendo atacados por grupos ativistas, e por uma mídia preconceituosa, os srs se "unem" a aqueles que não tem interesse de termos uma sociedade que preserva seus valores morais, éticos, familiares e cristãos. Os srs constituem-se amigos do mundo e inimigos de Deus.
UAU!
Muito bom os principios.
Eu tenho por hábito acompanhar a atuação dos políticos no decorrer do ano, fora da época de propaganda eleitoral, principalmente nos que ganharam meus votos. Até evito assisti-la, porque aí já terei minha opinião formada, a partir do acompanhamento diário dos posicionamentos no Congresso, Câmaras e nas Comissões. Não me deixo levar pelas propagandas, porque não as considero verídicas, a maioria, são teatros e engodo.
Não adiante, pessoal. A Dilma e a corja do PT vai sair dessa vez. Se gostam tanto do marxismo, por que não se mudam para Cuba?
Carlos Henrique, mais uma vítima do voto de cabresto, quer dizer, do voto de cajado. Mais um cuja capacidade de pensar por conta própria é raptada pelos "políticos da fé cristã". É uma pena, o que alertam para o voto de cajado não são apenas cristãos, são pessoas que pensam na sociedade como um todo, que não é feita apenas de cristãos. A referência aos provérbios é muito pertinente.
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